A endometriose é uma doença complexa, acometendo principalmente mulheres em idade jovem, e pode causar dores abdominais e infertilidade. Na maioria das pacientes, a endometriose acomete somente os órgãos superficialmente e pode ser tratada com remédios ou uma cirurgia – geralmente videolaparoscopia. Entretanto, em alguns casos a endometriose pode acometer o órgão além dos ginecológicos, nestes casos é conhecida como endometriose profunda. O intestino, especialmente o reto (porção final do intestino grosso) pode ser acometido nestes casos.
Sintomas
Os sintomas mais comuns da endometriose são dores abdominais, principalmente no período menstrual, além de infertilidade (dificuldade para engravidar). A presença de um nódulo de endometriose acometendo o intestino geralmente não causa sintomas intestinais específicos. Raramente nódulos muito grandes (maiores que 7-8 cm) podem crescer para dentro da luz intestinal e causar sintomas de obstrução.
Diagnóstico
O diagnóstico de endometriose intestinal é suspeitado a partir de uma ecografia de mapeamento para endometriose ou ressonância magnética da pelve. Entretanto, a confirmação deste achado só ocorre durante a cirurgia.
Cirurgia
A cirurgia é considerada um procedimento de alta complexidade. Entretanto, pode ser realizada por videolaparoscopia, desde que as equipes cirúrgicas tenham treinamento adequado. Geralmente, as duas equipes (ginecologia e cirurgia digestiva) realizam o procedimento de forma conjunta. São realizadas 3 ou 4 pequenas incisões no abdome (menores que 1 cm), seguido da insuflação de gás carbônico, que ajuda a distender o abdome e criar espaço para que o cirurgião realize o procedimento com ajuda de uma câmera e pequenos instrumentos (Figura). A operação é realizada com anestesia geral (os pacientes são avaliados no pré-operatório quanto as suas condições clínicas para a realização da cirurgia). Além dos procedimentos ginecológicos recomendados, a retirada do nódulo de endometriose que acomete o intestino pode se dar de diferentes formas:
- Raspagem (shaving): consiste na retirada do nódulo por meio de uma raspagem, sem abrir a parede do intestino. Este procedimento é reservado apenas para lesões pequenas (menores que 2 cm) e bem superficiais.
- Ressecção discoide: consiste na ressecção do nódulo por meio da retirada de uma “cunha” do intestino. Geralmente é indicada para lesões localizadas na parede anterior do intestino/reto e com tamanho limitado a 2-3 cm. É realizada com auxílio de um dispositivo automático (grampeador) que faz ao mesmo tempo o corte e a costura do intestino.
- Retossigmoidectomia: consiste na retirada de um segmento do intestino onde se encontra o nódulo. Pode ser utilizado para nódulos de qualquer tamanho e qualquer localização. Geralmente, é retirado um segmento de 8-10 cm do intestino (dependendo do tamanho da lesão e vascularização do intestino). Esta retirada geralmente não acarreta nenhuma alteração do ritmo intestinal da paciente. Após o procedimento, é necessário fazer a sutura (anastomose) do intestino, que também é geralmente realizada por dispositivos automáticos (grampeadores).
Complicações
A cirurgia de endometriose profunda é considerada uma cirurgia complexa, de grande porte. Além das complicações comuns a todos os procedimentos cirúrgicos em geral, como anestésicos, sangramento e infecção, quando necessário retirar um segmento do intestino algumas complicações específicas podem acontecer:
- Conversão: quando da impossibilidade de realizar a cirurgia por meio da videolaparoscopia (cirurgia dos furinhos), pode ser necessária a realização do corte para completar a cirurgia.
- Fístula: uma das mais preocupantes complicações, consiste no vazamento da secreção intestinal pela não cicatrização completa da costura (sutura) do intestino. O risco aproximado de fístula é de 2 a 5%, dependendo também de alguns fatores. Pacientes com lesões grandes, localizadas na parte mais distal do intestino (reto médio/baixo) apresentam maior risco desta complicação. O tabagismo também aumenta este risco em até duas vezes. Portanto, os pacientes devem parar o fumo de cigarro pelo menos 4 semanas antes da cirurgia. É importante salientar que atualmente a sutura do intestino é feita por meio de dispositivos automáticos, chamados de grampeadores (eliminado o risco de falha na costura realizada pelo cirurgião). Os pacientes com fístula podem apresentar basicamente duas evoluções: quando vazamento é pequeno, localizado e sem infecção grave, nestes casos o tratamento inicial é baseado na drenagem do vazamento para fora do abdome (através de dreno colocado na cirurgia ou após ela), antibióticos, nutrição especial (pelo próprio intestino ou pela veia; nutrição parenteral). Nestes casos os pacientes ficam internados pelo menos 2-3 semanas a mais para a cicatrização do intestino; quando o vazamento é grande ou difuso ou com infecção grave, nestes casos é necessário realizar na cirurgia a confecção de um “estoma” além de antibióticos e dieta especial.
- Estoma: colostomia ou ileostomia, é procedimento conhecido como colocação de uma bolsa do intestino na pele. Este procedimento pode ser necessário após qualquer cirurgia em que é necessário a retirada de um segmento do intestino (portanto, necessário fazer uma anastomose ou costura) no qual não ocorre a cicatrização adequada da sutura. O objetivo do estoma é fazer com que as secreções intestinais sejam desviadas, não passando mais pelo local que há o vazamento e permitindo assim a cicatrização do intestino. Os estomas geralmente são temporários. A reversão necessita de uma nova cirurgia geralmente 4-6 semanas após cicatrização do intestino.